Artigo originalmente publicado na Revista Online Personare
“Ser um homem feminino não fere o meu lado masculino.” (Pepeu Gomes)
Tanto os homens quanto as mulheres compartilham características que podem ser consideradas masculinas e femininas. Isso ocorre biologicamente e também animicamente. Biologicamente, os hormônios sexuais, estrogênio e testosterona, estão presentes em ambos os sexos, mas em proporções diferentes. O estrogênio é mais preponderante na mulher e a testosterona, no homem.
Animicamente, há dois arquétipos relacionados ao gênero, chamados Anima e Animus. O Animus é o arquétipo masculino presente na mulher e o Anima, o arquétipo feminino presente no homem. É sobre este último que este texto trata.
A Anima é um arquétipo que carrega as qualidades de contração, introspecção, acolhimento, o nutrir o outro, maternidade, o cuidar do outro. São qualidades tradicionalmente associadas ao feminino, e que o homem carrega em sua vida psíquica e pode, ou não, desenvolver ao longo da sua biografia.
Quando somos crianças e adolescentes, recebemos de fora nossa educação, seja pela família, pela escola, pelos grupos que frequentamos, pelas ideologias a que aderimos. Quando nos tornamos adultos, a nossa educação fica em nossas mãos, torna-se auto-educação, e todo nosso desenvolvimento a partir de então está sob nossa responsabilidade.
O cultivo e desenvolvimento da Anima pelo homem depende, então, de sua própria vontade. Nos primeiros anos da vida adulta, o homem se vê diante de circunstâncias que frequentemente o impelem à competição, e isso mantém a sua Anima meio adormecida, latente. Essa competição aparece na vida profissional, onde é mais evidente, assim como nos relacionamentos, em que a busca por uma parceira pode tomar ares de uma verdadeira caçada.
Já na faixa dos trinta anos, o homem (assim como a mulher) já busca temperar mais a razão (característica arquetipicamente masculina) com a emoção (característica arquetipicamente feminina) e assim há um surto de desenvolvimento de sua Anima, como se fosse a puberdade da Anima. As decisões já levam em conta não só fatores materiais, lógicos, mas também sentimentais. No trabalho, por exemplo, ter um bom salário já não representa o único, nem o mais importante, critério para um homem escolher um emprego. Estar num ambiente de trabalho agradável, junto com pessoas amigáveis, conta muito mais. No relacionamento, o fato de uma mulher ser bonita e gostosa diminui um pouco de importância aos olhos do homem, que passa a valorizar mais os atributos de companheirismo, carinho, atenção.
O desenvolvimento da Anima prossegue após esse ‘estirão’ e na faixa dos cinquenta anos a Anima amadurece e floresce no homem (sempre lembrando que a opção ‘ou não’ também é válida, afinal de contas somos livres para escolher o rumo de nossas vidas). Assim, nos relacionamentos amorosos e familiares, o homem passa a ser mais carinhoso, afetuoso, emotivo, demonstra mais os seus sentimentos. No trabalho, tem um cuidado maior com os colegas, principalmente com os mais jovens, de quem muitas vezes pode se tornar uma espécie de tutor e protetor.
Lembro que meu pai, que era um pai disciplinador, autoritário, nessa época me beijou pela primeira vez, o que me causou surpresa e alegria. O pai autoritário tornou-se um avô que cozinhava para nos receber, que puxava os netos pela casa em cima de um ‘tapete voador’, que aprendeu a dizer ‘eu amo você’, que admitiu que sentia muita saudade do pai que morrera há tantos anos, que chorava ao ser homenageado por estagiários em seu trabalho (ele era enfermeiro).
A Anima é um tesouro na vida anímica do homem, que traz conforto e maciez à própria existência e à daqueles com quem se relaciona. Por isso, homens, vamos cuidar bem de nosso lado feminino e fazer um mundo mais carinhoso.
Dedico este texto à memória de Warner, meu pai.